Não tinha mais como adiar, já eram seis horas da tarde e o céu já estava ficando avermelhado. Dentro de pouco tempo viria a noite e, com ela, o que tanto sonhei. Eu e ele já namorávamos há algum tempo, mas agora era diferente. Eu finalmente tinha saído de casa, e estava morando numa casinha simples no sul da velha Londres. Vizinhos pacatos, rua com árvores, gramados aparados... E a partir desta noite aconteceria a unica coisa que faltava: Meu namorado viria viver comigo.
Sempre foi um sonho que isso acontecesse e que finalmente pudéssemos viver uma vida feliz juntos sem ter que me importar com as preocupações de horário de meus pais e as limitações que eles impunham para meu relacionamento. Enfim poderia beijá-lo sem me preocupar com meus sobrinhos que poderiam estranhar este tipo de situação. Eu finalmente ia poder ser eu durante todo o tempo.
Não demorou muito e eu ouvi a garagem abrir. Tinha lhe dado as chaves, para que pudéssemos fazer assim como manda o figurino: o homem da casa chega depois de um dia longo de trabalho. O único problema aqui é que são dois homens e dois carros. Eu cheguei há pouco, e ele está chegando agora.
Creio que a esta hora alguns dos vizinhos já devem ter reparado nisso. Talvez ate mesmo aquela doce senhora que me trouxe uma torta de manhã... Não consegui conter minha curiosidade, tive que olhar pela janela. E lá estava ela na porta da casa a frente, como uma sentinela. Não me julguem mal, mas minha cabeça este dia não estava lá muito normal. Fui até a porta, vesti um roupão (porque estava só de bermuda) e sai. Fiquei na porta esperando meu amor vir para entrar. Não demorou muito e ele veio todo sorridente, como se também estivesse ansioso por esta noite. Eu o abracei pela cintura, e dei-lhe um beijo do tipo que se dá em seu namorado só em muito particular. Torci meu rosto para poder espiar o que acontecia com a senhora do outro lado da rua. Ela havia se levantado e estava entrando. Esperei ela sair e logo cessei o beijo e chamei meu namorado pra entrar.
Quando contei o que eu tinha feito ele só faltou me bater, mas também riu muito. Mal acabamos de vir morar juntos e já estávamos procurando encrencas com vizinhos. Mas no fim ficamos criando piadas imaginando a pobre senhora fazendo ligações para todos os vizinhos, espalhando o que poderia ser a única noticia realmente nova naquele lugar em décadas.
Fomos juntos para a cozinha, com o intuito de escolher o que fazer para o jantar. Apesar de cozinhar bem, não tinha muita experiência nesta historia de ser chefe de uma cozinha completa. No fim das contas acabei descobrindo que minha cozinha inteira era enorme e que iria ter que bolar um esquema mais inteligente de guardar os mantimentos, pois foram minutos desperdiçados procurando um simples pacote de pene. Pego mais alguns legumes na geladeira, queijo, berinjela... Pronto, tínhamos o cardápio: Uma salada simples de vegetais cozidos e um pene com molho de ratatouille! Chique, não?! Um pouco de culinária francesa faz bem a qualquer um, principalmente quando o assunto é um jantar a dois. Lógico, acho que nenhum chefe francês gostaria de me ver misturando o macarrão com o ratatouille, mas eu gosto de ousar às vezes. Minha unica dúvida ficou entre pegar uma garrafa de vinho que companhasse bem. Acabei pegando um Bandol rosé lindo que a muito tempo vinha guardando pra uma ocasião ocasião especial. Para ser franco, sou extremamente fraco pra vinho, mas acho que não há problemas em beber na sua casa com o seu namorado. Ainda mais em vinho tão lindo! Seria um pecado negar. Por sorte, seria justamente minha escolha natural pra harmonizar um ratatouille.
Apesar da proposta promissora e tentadora de meu namorado de ir tomar um banho junto com ele, eu preferi continuar na cozinha. Por quê? Ora, os motivos eram simples. Se eu ficar aqui cozinhando eu vou matar a minha fome, que esta me incomodando bastante. Já se eu subir, primeiro que esse jantar não sai nunca, segundo que nos vamos acabar nos “distraindo” e este banho vai causar um lapso na conta de energia. Logo presumi que começar a preparar o pene era a melhor opção. Coloquei o pene no fogo e comecei a cortar os legumes com muita calma. Geralmente, cortaria os legumes em farias bem finas, mas para o pene acho que fica melhor em cubos... Adoro cozinhar, como já devem ter percebido. Tenho que confessar que nada supera a sensação de ter uma cozinha só sua, de estar ali fazendo algo que você vai comer e, o melhor, comer junto com a pessoa que você escolheu pra passar o resto de sua vida. Não existe nada mais romântico que cozinhar pra quem se ama.
Não demorou muito e ele veio. Me abraçou pela cintura sem que eu pudesse ver que ele estava chegando e me mordeu a orelha de um jeito... É como se soubesse que bastaria aquilo pra eu me derreter em seu colo. E foi dito e feito. Não resisti, larguei a massa sozinha na panela e me virei para ele. Nem precisa falar que perdemos um bom tempo neste ritual de mordidinhas e beijos. Acho que para os que já se aventuraram na cozinha se torna quase obvio que nesse meio tempo o que era pra ser um macarrão ao dente se tornou uma sopa que mais lembrava um angu grosso. Resultado: Para o beijo! Vamos nos concentrar na comida.
Ele, que é praticamente uma negação quando os assuntos são panelas e talheres, ficou por conta de substituir o tao macarrão. Eu comecei a refogar os legumes do molho. O molho do ratatouille pode ser infinitamente complexo, se quiser. Eu estava usando simplesmente um refogado com orégano fresco, alho e cebola, cujo cheiro encantadoramente simples trazia a tona exatamente o espirito que eu queria pra minha nova casa. Rala queijo, monta salada, escorre a massa, harmoniza tempero... Não demoramos mais que trinta minutos para acabarmos de preparar o jantar. Ainda acho que poderia ter sido menos tempo se nos tivéssemos resistido ao fogo, mas ele estava radiante, então não dava pra aguentar a tentação de beijá-lo quase que sempre. Mesa posta, talheres, pratos, o Bandol nas taças e um castiçal com três velas. Vocês devem estar rindo, mas é que eu realmente queria que a noite fosse perfeita, logo me muni antes de todos estes itens. Perfeccionismo é uma marca forte dos librianos e quem sou eu pra ser diferente? Ainda mais quando o assunto é arrancar cada sorriso do rosto do meu amor.
Jantamos e conversamos muito. O molho, mesmo simples, tinha ficado divino! (Mas fica a nota mental de usar um pouco de noz moscada na próxima, só pra ver como irá ficar.) Meu amor gostou tanto que chegou a comer um pouco mais que o necessário. Eu quase o acompanhei, mas resiste ao menos a esta tentação. Digo ao menos que talvez tenha tomado... Tá! Tomei umas três taças de vinho bem cheias, o que definitivamente era bem mais do que eu estava acostumado. Porem não foram o suficiente para me tirar de mim, apenas me deram mais descontração. Fomos para a cozinha e deixamos as vasilhas muito bem organizadas ao lado da pia. Por que não as lavei?! Era obvio que eu tinha planos melhores para o resto da minha noite do que ficar lavando pratos! (Tarefa essa que eu acho a mais horrorosa da cozinha.)
Subimos, e agora sim era a hora adequada pra passar no banheiro. Deixei meu namorado no quarto e tomei um banho não muito longo. Perfumei-me, arrumei mais ou menos o cabelo, cueca preta, um robe roxo lindo. Pronto! Sei que ele não repara em metade destes meus zelos, mas me sinto muito bem em tê-los. Quarto com luz apagada. Quando penso em me virar pra acender a luz do abajur, ele vem e me abraça pela cintura. Devo ser um total idiota! Tanto tempo namorando com este cara e ele me pega sempre do mesmo jeito. E o pior: eu sempre me derreto nos seus braços. Ele me conduz até a cama... Mais beijos... Tira meu robe... Bem... Acho que não foi nada mau para uma primeira noite morando juntos.